SUPERSALÁRIOS

Supersalários: 30% dos juízes pernambucanos recebem acima do teto

No mês de julho 156 dos 545 magistrados do TJPE receberam acima de R$ 37,5 mil

Brasil de Fato | Recife (PE) |
Magistrados do TJPE receberam até R$ 60 mil só no mês de julho
Magistrados do TJPE receberam até R$ 60 mil só no mês de julho - Assis Lima/Ascom TJPE

Com direito a salários mensais fora da realidade da população brasileira, algumas pessoas que atuam na estrutura do Estado reivindicam auxílios que, ao serem somados ao salário, ultrapassam o teto legal. São os chamados “supersalários”. A prática é frequentemente denunciada no alto escalão do Poder Judiciário brasileiro. Em Pernambuco, no mês de julho, 28,6% dos magistrados recebem acima do teto constitucional.
De acordo com levantamento realizado pelo site Poder360, em julho, 156 (ou 28,6%) dos 545 magistrados do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) receberam salários acima dos R$ 37.493,97, que é o salário bruto de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e, consequentemente, o teto salarial para o funcionarismo público no Brasil.
Se esses 156 magistrados do TJPE que receberam “supersalários” recebessem o teto, os cofres de Pernambuco gastariam a soma de R$ 5,85 milhões em julho com salários dos magistrados. Mas foram gastos R$ 6,075 milhões, um gasto extra de aproximadamente R$ 225 mil só no mês de julho.
Os maiores salários do mês de julho no TJPE foram os do desembargador presidente do tribunal, Leopoldo de Arruda Raposo, com vencimento de R$ 60 mil; o desembargador Adalberto de Oliveira Melo, 1º vice presidente do TJPE, com salário de R$ 56 mil; e o desembargador Carlos Frederico Gonçalves de Moraes, que recebeu R$ 49,9 mil de salário só no mês de julho. Confira a lista completa dos nomes clicando aqui.
O advogado Jefferson Abreu e Lima, membro da Frente de Juristas pela Democracia, questiona os benefícios concedidos ao que ele chama de “castas” de servidores públicos e pessoas em cargos políticos. Para o advogado, um país com as desigualdades do Brasil não suporta isso. “Se compararmos, enquanto a maior parte dos trabalhadores está lutando por direitos sociais básicos, verdadeiras benesses estão sendo concedidas para essa ‘alta casta’ do serviço público”, avalia o advogado. Ele aponta que há distorções na administração pública nacional que permitem a criação de “castas de poder que se cercam de privilégios”. E que a situação não se restringe ao Judiciário.
Ele recorda também de um caso curioso, de que o debate dos “supersalários” do judiciário chegou ao Ministério Público e acabou sendo totalmente distorcido. “No MP, em vez de debaterem a legalidade desses auxílios, o debate voltou-se para a busca pela aplicação dessas mesmas benesses também ao Ministério Público”, aponta.
Para Abreu e Lima, esses auxílios não podem ser tratados como direitos trabalhistas a serem preservados. “São tantos benefícios indiretos, como combustível, carro oficial, auxílio moradia, benefícios de saúde e assistência e outros, que não dá para falarmos de direitos básicos. São excedentes, excessos”, opina o advogado. “E se o Estado tem condições de conceder esses benefícios, então que seja para todos os servidores”, reclama. “É preciso democratizar os direitos e o acesso às riquezas. Não é democracia se for apenas para as elites. É preciso ser comum a todos”, pontua.
Na avaliação do jurista, o debate dos “supersalários” é uma oportunidade para pautar uma reforma administrativa. “Por que quando buscamos um direito, principalmente se é enfrentando a administração pública, precisamos recorrer ao Poder Judiciário através de demanda judicial, mas acontece tudo diferente quando é para conceder direitos aos próprios entes da administração?”, questiona.
Abreu e Lima também compara com o contexto atual de crise no País. “No fim de 2016, enquanto a população estava protestando contra a PEC do Teto de Gastos, o TJPE instituiu uma nova verba remuneratória. Este ano, para a população, vemos a extinção dos direitos trabalhistas. Ou seja, enquanto se retira direitos básicos do cidadão comum, a ‘alta casta’ de servidores recebem benefícios sem limites e sem teto”, aponta.
O levantamento foi realizado em tribunais de justiça de 15 estados. Os TJs de outros estados ainda dificultam o acesso a tais dados. Se o teto fosse respeitado, os 15 tribunais gastariam a soma de R$ 157,2 milhões em salários dos magistrados. Mas em julho foram gastos R$ 229,6 milhões. Ou seja, a soma do “extra teto” nas 15 unidades federativas pesquisadas é de R$ 72,4 milhões só no mês de julho.
No total 6.386 juízes possuem vínculo com os 15 tribunais de justiça pesquisados e, desses, 4.655 – ou 72,9% – recebem salários acima do teto. Os estados com maior percentual de juízes com “supersalários” são Sergipe (100%), Espírito Santo (99,7%), Acre (94%) e São Paulo (91,5%).
Uma resolução de 2006 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), assinada pelo seu então presidente do CNJ Nelson Jobim, permite que verbas como auxílio moradia, auxílio funeral, diárias, indenização com transporte, ajuda de custo para mudança, entre outras, não sejam contabilizadas como salário, permitindo assim que os vencimentos mensais de juízes ultrapassem o teto.
Projeto de Lei
Está em debate na Câmara Federal um projeto de lei para limitar os “supersalários” nas três esferas do Poder Público. Criado por uma comissão especial do Senado em 2016, o projeto passou meses sem tramitar na Câmara, até que matérias publicadas em veículos de comunicação acabaram pressionando a Câmara a dar andamento ao PL. Para avançar na Câmara o documento ainda precisa passar por uma comissão especial para analisar o projeto. A comissão, no entanto, ainda não foi criada.

Edição: Marcos Barbosa