Rio de Janeiro

EDUCAÇÃO

Artigo | Incêndio do Museu Nacional anima setores contrários a universidade pública

Os que querem expandir grupos educacionais privados julgam que o Brasil não precisa formar "doutores"

Brasil de Fato | Rio de Janeiro (RJ) |
Bombeiros apagam pontos de fogo no Museu Nacional após incêndio
Bombeiros apagam pontos de fogo no Museu Nacional após incêndio - Foto:Tomaz Silva/Agência Brasil

O incêndio do Museu Nacional ocorrido no inicio do mês foi debelado, mas deixou sequelas para além da destruição física de um prédio e acervos preciosos. Trouxe de volta a velha polêmica sobre a ineficiência do setor público. Setores sempre contrários às universidades públicas se animaram. A vetusta e falaciosa argumentação sobre gastos excessivos e má gestão emergiu da fumaça. Universidades de países com distintas tradições acadêmicas são avaliadas por um conjunto de indicadores, incluindo a produção de pesquisas (número de artigos) e sua qualidade (impacto de citações e número de artigos altamente citados), produção educacional (proporção de docentes em  tempo integral e alunos graduados) e despesas. 

O principal diferencial para que uma universidade seja bem avaliada é sua dimensão institucional. Ou seja, os números de professores e alunos determinam a produção de pesquisa e a alocação de recursos para a educação e pesquisa refletem-se no bom desempenho da pesquisa. 
Desde sua fundação, a UFRJ está bem situada nos rankings internacionais, o aumento do número de alunos e professores foi simultâneo ao de sua produção científica.  Para o Brasil, um país que ainda permanece às voltas com necessidades de garantia do acesso ao ensino superior e geração de alternativas para mudanças em seus padrões de produção e consumo de bens e serviços, universidades públicas dotadas de corpo docente qualificado são estratégicas.

Os melhores profissionais de diferentes áreas de atuação foram e são formados por universidades públicas.  A ciência e tecnologia incorporadas em diversas cadeias produtivas são dinamizadas por professores e alunos de graduação e pós-graduação. Estudos sobre a sociedade, economia, cultura e história têm sido nucleados por pesquisadores das grandes universidades brasileiras. É por isso que a população sempre que consultada indica sua concordância com a expansão dos gastos públicos com educação, inclusive universitária.  Sabe-se que, sem universidade pública, o futuro do Brasil é o retorno ao passado de um país pobre, injusto, agrário-exportador com mínimas chances de futuro. 

A ideia de restringir o direito à educação não conta com apoio social, é antidemocrática. A UFRJ tem muitos e intrincados problemas. Suas unidades acadêmicas, hospitais, bibliotecas, centros culturais e o Museu Nacional foram vinculados à universidade ao longo do tempo.  A gestão desse conjunto rico e heterogêneo de acervos e conhecimentos é em si desafiante.

Desde 2015, os recursos de custeio e investimentos foram cortados. Definir a prioridade entre tantas prioridades, alocar acertadamente os recursos de custeio e investimentos é responsabilidade da UFRJ. Provimento de concursos, definição de salários e produção de informações sobre gastos com servidores públicos federais são atribuições que extrapolam as fronteiras da universidade. Mudanças para ampliar o direito à educação exigem redefinição de responsabilidades e sempre mais transparência. Salários dos professores e a execução orçamentária são informações oficiais e disponíveis. 

Números podem ser consultados, serão interpretados com menos ou mais acurácia se os pressupostos sobre a relevância ou inutilidade das universidades públicas forem desvelados. Outros números evidenciam a disposição de ampliar o patrimônio científico público. O incêndio também revelou o imenso apreço nacional e internacional pela universidade pública. O debate sobre a ampliação da universidade pública não é apenas uma escolha técnica.  Os que querem expandir grupos educacionais privados julgam que o Brasil não precisa formar "doutores". Podem pagar o estudo de seus filhos fora e insistem em retroceder na compreensão sobre a inextrincável associação entre educação e democracia.   

*A AdUFRJ é a Associação dos Docentes da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Edição: Jaqueline Deister