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crítica

Artigo | Consumismo, desprezo humano e egoísmo são temas de "O Poço"

Produção espanhola "O poço" apresenta um futuro antiutópico e traz reflexões sobre a sociedade contemporânea

Brasil de Fato | Recife (PE) |
Trata-se de uma obra da sétima arte que diz respeito a uma era do consumismo exacerbado e denuncia o egoísmo humano - Divulgação

A Netflix mais uma vez dispara na frente com produções que chamam a atenção do público. Dessa vez a plataforma de streaming traz "O poço", produção espanhola que apresenta um futuro antiutópico, onde uma prisão vertical mantém duas pessoas em cada andar, com a comida sendo distribuída de cima para baixo. Trata-se de uma obra da sétima arte que diz respeito a uma era do consumismo exacerbado e denuncia o egoísmo humano.

Para criar uma atmosfera de suspense foi utilizado um contraste do vermelho com as cores frias que causam a sensação de um local sombrio. Além disso, a ambientação do cenário com espaços pequenos e o trabalho da fotografia conseguiram transmitir um sentimento de claustrofobia que traz o telespectador para o isolamento do filme.

Em uma análise através do prisma social e econômico, existe uma metáfora que traz para a principal reflexão a desigualdade existente em nosso atual sistema capitalista. Para construir a analogia com a nossa realidade, o diretor Galder Gaztelu-Urrutia utilizou-se das plataformas como comparativo das classes sociais onde quem estava no topo desfrutava do privilégio de comer antes dos demais, assim deixando as sobras (também chamadas de ração) paras os que estavam abaixo.

Aqui no Brasil as semelhanças com o filme não são meras coincidências. Em junho do ano passado, numa comunidade em Olinda, pessoas foram flagradas abordando um caminhão de lixo para pegar restos de alimentos descartados por um supermercado, que deveria seguir para os aterros sanitários.

Não se pode esquecer do episódio que aconteceu em São Paulo, em 2017, quando o prefeito cogitou produzir rações para os pobres, enquanto ricos continuavam comendo em restaurantes com estrelas Michelin, pagando R$230 por um hambúrguer ou R$500 por um menu degustação. 

O filme é quase que uma anunciação do futuro com um retrato claro da escassez de alimentos e da ganância humana. No entanto, a esperança surge de personagens como a de Goreng (Ivan Massagué) que, junto a um dos seus companheiros de cela, o Baharat (Emilio Buale), descem as plataformas corajosamente utilizando-se da força física para tentar controlar o que cada um comia, talvez seja assim o futuro: um tipo de rodízio, uns comendo hoje outros amanhã.

Com o movimento em direção ao que se tinha de mais submerso no poço, foi possível flagrar uma violência brutal respalda pela “justificativa” de que é necessário sobreviver. Quando pensamos no mundo real não é diferente, pois cada vez que adentramos as camadas sociais mais baixas encontramos altos índices de criminalidade. É fácil constatar que a pobreza gera violência!

Com um final intrigante o diretor Galder deixou para os telespectadores lacunas para diversas interpretações, porém ele consegue passar uma mensagem de esperança para as futuras gerações que foi traduzida pela imagem da garota, afinal como disse Trimagasi  (Zorion Eguileor) “a mensagem não precisa de um portador”.

* Gabriel Ramos é jornalista, roteirista e diretor.

Edição: Marcos Barbosa