Rio Grande do Sul

Descaso

Trabalhadores denunciam falta de comida e de nutricionista em posto de saúde

Pronto Atendimento da Cruzeiro do Sul (PACS), um dos maiores de Porto Alegre, tem sofrido com a falta de alimentação

Sul 21 | Porto Alegre |
Após ter a cozinha fechada, o PA da Cruzeiro do Sul tem recebido comida sem data de fabricação e sem opção de dieta específica para pacientes com restrições - Arquivo Pessoal

Não é apenas a pandemia do novo coronavírus que tem afetado a rotina do Pronto Atendimento da Cruzeiro do Sul (PACS), um dos maiores de Porto Alegre. Além da doença que abala o mundo, o local tem sofrido com a falta de alimentação adequada e escassez de profissionais da saúde. Há cerca de três semanas, a Prefeitura da Capital fechou a cozinha e o refeitório que serviam, em média, 350 refeições para pacientes e funcionários. O local funcionava há décadas com equipe própria, incluindo nutricionistas.

A alimentação agora tem sido feita em outro local e entregue duas vezes ao dia dentro de caixas. A dieta não é assinada por nenhum nutricionista e tampouco há data de fabricação e validade. As porções são contadas e não há mais a possibilidade de refeições específicas para pacientes com dieta restrita. Para o paciente com limitação na dieta, a única opção tem sido sopa. E se não for comida logo após a entrega, o paciente a recebe fria mesmo, pois não há mais onde esquentar. A alimentação láctea específica para crianças também não está mais disponível.

A Comissão de Saúde e Meio Ambiente da Câmara de Vereadores solicitou esclarecimentos do governo de Nelson Marchezan Júnior (PSDB) sobre o motivo do fechamento do refeitório e a terceirização do serviço de nutrição do Pronto Atendimento Cruzeiro do Sul. No documento, a Comissão cita que os alimentos estão sendo transportados em contêineres, com higienização precária, e em carros sem refrigeração, além de transportarem também materiais biológicos.

“É importante salientar que hoje o PACS não conta com profissionais da área da nutrição, responsáveis pela distribuição das refeições e prescrição dos alimentos aos pacientes internados, serviço esse que deve ser realizado mediante determinações nutricionais. Fato grave, é que a gestão repassou essa tarefa aos profissionais da enfermagem, sendo que estes servidores não são aptos a realizar serviços de assistência nutricional”, diz trecho do pedido de explicação.

Há 20 anos trabalhando no Pronto Atendimento Cruzeiro do Sul, a enfermeira Rosana Metrangolo diz que a situação está difícil. O fechamento da cozinha e a piora na qualidade da alimentação, dificultam ainda mais o estado clínico dos pacientes, assim como dos próprios profissionais de saúde, já sobrecarregados e lidando com altos picos de estresse devido ao enfrentamento da pandemia.

“É um momento muito difícil, uma situação grave demais”, afirma Rosana. “Estamos com muitos problemas, funcionários adoecendo e agora ainda sem comida, com dieta sem nutricionista. São coisas mal pensadas, principalmente numa época de pandemia, em que é preciso ter alta imunidade, tanto do trabalhador quanto do paciente”.


Sem a cozinha e o refeitório, a alimentação tem sido restrita num dos maiores postos de saúde de Porto Alegre / Arquivo Pessoal

Falta de funcionários

Ao fechamento da cozinha e do refeitório, Rosana acrescenta a falta de profissionais como outro sério problema enfrentado no PA da Cruzeiro do Sul. Com a experiência de quem está há 20 anos atuando no local, ela conta que, nesse período, o número de funcionários diminuiu e não há reposição. O PACS tem uma ampla oferta de atendimento na região, incluindo saúde mental, odontologia, traumatologia, tuberculose e, agora, covid-19.

“É um posto grande e vem sofrendo um nocaute periódico. Conheço bem o posto, já foi um serviço de referência. Eles desmancharam tudo. Hoje, estamos cada vez menores. Ainda é um local que presta um grande trabalho, ainda é referência em tuberculose, mas passa por uma situação difícil e um quadro de pessoal, no limite”, afirma Rosana Metrangolo.

A enfermeira acredita que a intenção da Prefeitura, no fundo, é terceirizar o serviço do posto. Segundo ela, o diálogo com o governo municipal é difícil. “Eles só têm um foco, que é a terceirização”. Com equipe reduzida e ainda mal alimentada em plena crise do coronavírus, Rosana conta que o desgaste dos profissionais tem sido grande. E há também a dificuldade no acesso aos equipamentos de proteção individual (EPIs), oferecidos em quantidade insuficiente. “Estamos sobrecarregados demais”, diz ela.

A Prefeitura de Porto Alegre foi procurada, mas não respondeu até o fechamento da notícia.


 

Edição: Sul 21