Paraná

Cidades

Coluna | Observatório mostra que conflitos se acirram com pandemia

Confira o resumo dos principais protestos ocorridos em Curitiba e Região Metropolitana em abril e maio

Curitiba |
Militantes do PCO, Antifa e torcedores antifascistas de três clubes da capital participam de manifestação em Curitiba - J. C. Carrignano

Esta é a coluna do Observatório dos Conflitos Urbanos de Curitiba, que apresenta o resumo dos principais protestos ocorridos em Curitiba e Região Metropolitana ao longo dos meses de abril e maio de 2020. O Observatório é composto por professores e pesquisadores da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) e da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

 

Para combater a propagação da Covid-19, a Organização Mundial da Saúde, OMS, recomenda medidas de distanciamento e isolamento social, evitando aglomerações. Desde meados de março de 2020, tais medidas têm produzido efeitos no Brasil, inclusive nas formas de organização e manifestação política que analisamos pelo Observatório de Conflitos Urbanos. Ao mesmo tempo, as ações dos governos ou governantes em diferentes níveis da federação para enfrentar a pandemia têm sido contraditórias e, de modo geral, resultam no aprofundamento das desigualdades que caracterizam a sociedade brasileira e no acirramento da polarização política, implicando na emergência de novas formas de protesto. As manifestações analisadas mostram diferentes efeitos da Covid-19, entrecruzando aspectos de gênero, raciais e territoriais que impactam as relações de trabalho, as condições de moradia, de educação e de saúde. Nesse contexto, a defesa da vida adquire centralidade em conjunto com as reivindicações por democracia, evidenciando a conexão presente nas manifestações entre o autoritarismo e a desconsideração das demandas sociais.

Manifesto por direitos e pela vida dos trabalhadores
O Comitê Unificado de Lutas, que reúne diversas entidades sindicais, movimentos sociais e partidos de esquerda, populares e democráticos, realizou reunião em 6 de abril e lançou manifesto defendendo um programa emergencial em defesa da classe trabalhadora, prestando solidariedade aos trabalhadores dos serviços essenciais e apoiando as medidas que são consenso entre os especialistas mundiais na área da saúde e as recomendações da OMS.
A carta reitera que o combate à pandemia não pode ser pretexto para a retirada de direitos dos trabalhadores e das trabalhadoras, pois tal atitude beneficia apenas os grandes empresários e banqueiros à custa de saúde, vida e dignidade da maioria da população. Nesse contexto, critica a inoperância do governador Ratinho Júnior e do prefeito de Curitiba, Rafael Greca, além de se contrapor ao presidente Bolsonaro, e exige o fim de um governo que não valoriza a vida e minimiza a morte de seres humanos.
A campanha segue de maneira unificada e solidária, com a compreensão de que ela não deve nem pode substituir os poderes públicos, aos quais cabe toda a responsabilidade pelo atendimento das necessidades da população e garantias de condições para que as pessoas sigam as recomendações de isolamento social e proteção rigorosa e adequadamente.

Manifestantes pedem fim do isolamento social 
No dia 10 de abril, ocorreu o “Profetiza Curitiba 2020”, no Centro Cívico. Em formato de carreata, o evento reuniu manifestantes que pediam o fim do isolamento social e, contrariando a recomendação da OMS sobre evitar aglomerações, se reuniram e fizeram orações em prol de Jair Bolsonaro.
No dia 13 de maio, quarta-feira, uma carreata composta de aproximadamente 70 veículos foi organizada por manifestantes pró-Bolsonaro. Vindos de diversas partes da cidade e concentrando-se na Praça Nossa Senhora de Salete, os participantes buscavam pressionar o governador paranaense para que acompanhe as decisões das gestões municipais. O presidente da Abrabar (Associação Brasileira de Bares e Casas Noturnas), Fábio Aguayo, defendeu a reabertura do setor gastronômico, pedindo ao governo estadual que permita a volta dos serviços não essenciais. A carreata foi acompanhada a distância pela Guarda Municipal. 
Em 18 de abril, representantes de 50 academias de Curitiba realizaram manifestação pedindo a reabertura das academias em frente ao Palácio Iguaçu, no Centro Cívico. Os manifestantes pedem que o poder público autorize a reabertura das academias, mediante cumprimento das normas da Organização Mundial da Saúde (OMS) e do Ministério da Saúde.
No dia seguinte (19), apoiadores de Bolsonaro realizaram outra carreata pelo fim da quarentena, além de demonstrarem desacordo com Rodrigo Maia e a Rede Globo.

Coletivos antifascistas realizam ato em Curitiba
Em 31 de maio, coletivos antifascistas de Curitiba foram às ruas contra as manifestações denominadas por eles de “antidemocráticas” dos apoiadores do presidente Jair Bolsonaro, que pediam o fechamento do Congresso, do Supremo Tribunal Federal (STF) e a Intervenção Militar. Por volta das 14h, cerca de 100 manifestantes bloquearam a avenida Cândido de Abreu, no Centro Cívico, de onde partiria uma carreata convocada por bolsonaristas, que pressionados pelos gritos de “Recua, Fascista”, mudaram seu trajeto. As manifestações continuaram no início de junho.

#ExposedCuritiba denuncia violência contra a Mulher 
No Twitter, no mês de maio, a hashtag #ExposedCuritiba somou mais de 40 mil menções, em que diversas curitibanas compartilharam relatos de assédio, violência e abuso sexual vindos de namorados, parentes, professores, conhecidos e amigos. O engajamento, que ocorreu também nas cidades de Florianópolis, Londrina, Marília e Paranaguá, fez com que mulheres criassem coragem para compartilhar relatos silenciados até então. Entretanto, as autoridades alertam para alguns cuidados que devem ser evitados para não prejudicar a vítima duplamente, como não expor o nome do agressor e procurar os canais oficiais, como a Polícia Militar ou o Disque Mulher. 

Movimento por moradia ocupa imóvel em Campo Magro
Cerca de 100 pessoas ligadas ao Movimento Popular por Moradia (MPM) ocuparam imóvel ocioso em Campo Magro, em 25 de maio. O imóvel pertence à Prefeitura de Curitiba, foi cedido ao Governo do Estado do Paraná e estava sem cumprir sua função social desde 2009. O MPM declara querer chamar a atenção para a crise de moradia agravada pela Covid-19. Há, na ocupação, pessoas que perderam a moradia recentemente pelo desemprego ou por não terem renda suficiente para pagar aluguel. A situação aponta para a necessidade de um plano para enfrentar a crise de moradia. A assessoria de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Paraná (Alep) faz interlocução entre os ocupantes, governo do Estado e as prefeituras de Curitiba e Campo Magro. 

Educação na Pandemia e Campanha  #AdiaENEM 
Um dos temas que mobilizou diversas manifestações durante a pandemia foi a Educação, fortemente impactada pela Pandemia de Covid-19. O fechamento das instituições educacionais em todos os níveis foi a primeira e é a mais duradoura medida de distanciamento adotada pelos diferentes níveis de governo, resultando em diversas medidas relacionadas, como, por exemplo: a pressão pela retomada das atividades de ensino por via remota - com o lobby das entidades privadas, representadas pelo Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do Estado do Paraná (Sinepe) -  e a reação ao corte de salários de professores da rede municipal em Curitiba, justificado pela Secretaria Municipal de Educação pela não adesão dos docentes ao ensino a distância.
Nesse contexto, a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES) e a União Nacional dos Estudantes (UNE) convocaram ato virtual, no dia 15 de maio, pelo adiamento da aplicação do Exame Nacional do Ensino Médio. A campanha, chamada Dia Nacional pelo #AdiaEnem, denunciava a desigualdade na preparação para o exame diante de aulas suspensas pela quarentena, já que vários estudantes não têm acesso à internet, nem professores disponíveis para atendimento, além das famílias estarem passando por dificuldades durante a pandemia. Por isso, estudantes e apoiadores levantaram a hashtag #AdiaEnem nas redes, pedindo que o Ministério da Educação suspendesse o calendário previsto para o ENEM e aguardasse as implicações da pandemia do Coronavírus. 
Em Curitiba, diversos estudantes e servidores da UFPR, UTFPR, IFPR e Unespar aderiram à campanha. Há, ainda, manifesto pedindo o adiamento feito pela frente da Campanha Nacional pelo Direito à Educação e assinada por diversas entidades e movimentos presentes em Curitiba, incluindo a APP-Sindicato e o Instituto Paranaense de Cegos.
Na terça-feira, 19, o Senado aprovou, por quase unanimidade, o projeto que adia o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) para somente após o fim do ano letivo de 2020. Contudo a UBES e a UNE denunciam que o Ministério da Educação está utilizando uma votação online com os candidatos inscritos na prova para decidir a nova data - atitude que, segundo as entidades, é excludente, já que não contempla os estudantes que não puderam se inscrever por não terem acesso à internet. Assim, essa medida apenas agrava a desigualdade na educação no país, pois privilegia os estudantes mais ricos e com mais chance de acesso às universidades em 2021.
O Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Paraná (APP Sindicato) já havia encaminhado, no mês de abril, denúncia ao Ministério Público do Trabalho  apontando a má conduta do Estado na realização destas aulas durante a quarentena. Segundo a direção da APP Sindicato, a institucionalização de aulas a distância aconteceu com pressão da rede privada, que exigiu a regulamentação das aulas não presenciais. A partir disso, sem diálogo com professores e equipes pedagógicas das escolas, o governo do Paraná também optou por educação a distância (EaD). 
Ainda segundo o Sindicato, os professores que não entraram na plataforma para colocar suas aulas receberam ameaça de descontos na folha de pagamento e os alunos levariam falta. Há diversos relatos sobre erros nas plataformas virtuais, início das aulas ter ocorrido sem consulta aos professores e ameaças feitas aos professores e alunos. A APP denuncia que a Secretaria de Educação contratou uma empresa de tecnologias educacionais e a TV Record, cuja rede de transmissão cobre apenas 28% dos municípios do Paraná.

Confira mais manifestações que ocorreram entre os meses de abril e maio:
•    Sindicato dos Agentes Penitenciários entra com ação junto ao Ministério Público por direito à prevenção;
•    Policiais denunciam coronel por contrariar medidas sanitárias da Covid-19;
•    Mudança em merenda orgânica das escolas públicas do Paraná gera reivindicação;
•    Funcionários da Renault Brasil fazem manifestação em frente à fábrica para redução da jornada
 

Edição: Frédi Vasconcelos