INDÍGENAS

Covid-19 já matou 15 indígenas no Rio Grande do Sul

Taxa de mortalidade no estado é de 32,1 (por 100 mil habitantes), enquanto entre os povos indígenas é de 51,8

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11 mortes por covid-19 entre população indígena kaingang - Reprodução

A população indígena kaingang, que vive no município de Charrua, localizado no norte do Rio Grande do Sul, está sendo duramente atingida pela covid-19. Na noite de terça-feira (8), foi confirmado o 11º óbito, um homem de 83 anos, que estava internado na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital Santa Terezinha, em Erechim. A população estimada do município de Charrua é de 3.252 pessoas, sendo 1.453 kaingang que vivem na Reserva Indígena do Ligeiro. Segundo a Prefeitura de Charrua, o primeiro óbito na comunidade kaingang ocorreu no dia 9 de julho. De lá para cá, mais dez indígenas morreram vitimados pela enfermidade causada pelo novo coronavírus.

Segundo o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), é o maior número de óbitos até aqui em uma terra indígena no Rio Grande do Sul. O levantamento do Cimi sobre o impacto da covid-19 nas comunidades indígenas do estado, consolidado até o dia 4 de setembro, aponta um total de 766 casos positivos, com 15 óbitos, 41 casos em acompanhamento e 711 recuperados. De acordo com esses números, a taxa de mortalidade por covid-19 entre as comunidades indígenas do RS é de 51,8 (p/100 mil habitantes), enquanto a taxa de mortalidade entre a população do estado é de 32,1 (p/100 mil habitantes).


Levantamento da Prefeitura de Charrua, atualizado em 9 de setembro / Facebook/Reprodução

O caso de Charrua, onde já há quase 200 casos de covid-19, preocupa muito e é definido como uma “situação de calamidade pública” por Ivan Cesar Cima, membro da Equipe Frederico Westphalen e da Coordenação Colegiada do Cimi Sul. Para ele, o que está acontecendo em Charrua exige uma atenção urgente por parte das autoridades. “O que está acontecendo é reflexo das políticas do governo Bolsonaro para a saúde indígena, que estão reduzidas a um atendimento paliativo, com profissionais trabalhando sem equipamentos de segurança e com dificuldade para chegar a muitas comunidades por falta de recursos”, afirma.

Ivan Cima alerta que a realidade das comunidades indígenas no Rio Grande do Sul, nesses tempos de pandemia da covid-19, é ainda mais dramática, uma vez que se soma a um contexto de graves violências praticadas pelo Estado contra a vida desses povos. Assim como está acontecendo em outras regiões do país, aqui no Rio Grande do Sul, os números do contágio são alarmantes. “Já são mais de 760 casos, isso significa que cerca de 2% dos indígenas já contraíram o vírus, contra 0,98% do restante da população e que já foram perdidas 15 vidas”, resume.

“Do jeito que está, mortes não vão parar”

O presidente do Conselho Estadual de Povos Indígenas no Rio Grande do Sul (Cepi), Deoclides de Paula, classifica como grave a situação na Reserva do Ligeiro e defendeu a necessidade de uma intervenção mais enérgica por parte das autoridades para evitar que as mortes de kaingang continuem acontecendo. “Acho que vai ter que haver um isolamento mais rígido lá, porque do jeito que está as mortes não vão parar. Não há planejamento algum nem recursos para evitar que isso continue ocorrendo”, disse Deoclides, que é cacique kaingang na Terra Indígena Kandoia, onde até agora não houve nenhuma morte causada pela covid-19. “Aqui a população é menor e fica mais fácil controlar, mas lá no Ligeiro tem quase duas mil pessoas. As lideranças têm que ter alguma ajuda de fora para fazer um isolamento mais forte”, assinala.

O Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH) encaminhou, dia 25 de agosto, um ofício à secretária municipal da Saúde e Assistência Social de Charrua, Janete Derengoski, pedindo informações sobre os casos de covid-19 entre a população indígena do município. Entre outras informações, o CNDH solicita o número de testes realizados no município, os resultados dos mesmos, o números de casos confirmados e o número oficial de óbitos de indígenas por covid-19. Assinado por Renan Vinicius Sotto Mayor de Oliveira, presidente do Conselho, o ofício pede que as informações sejam enviadas em um prazo de dez dias. Até o dia 8 de setembro, a Secretaria ainda não havia respondido a solicitação.

O Sul21 entrou em contato com a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), Pólo Base Passo Fundo, região na qual está localizada a reserva do Ligeiro, para saber as medidas que estão sendo tomadas para enfrentar o contágio de covid-19 entre os kaingang. A Sesai de Passo Fundo disse que não estava autorizada a prestar informações sobre o tema e que somente a superintendência da Região Sul, em Florianópolis, poderia se manifestar. O Sul21 também entrou em contato com Florianópolis, mas até o fechamento dessa matéria, não teve acesso a informações sobre o que está sendo feito a respeito.