Pernambuco

PEC 32/2020

Artigo | O Brasil do pós-pandemia precisa de mais Estado

A proposta de reforma administrativa do governo Bolsonaro significa a falência do Estado brasileiro

Brasil de Fato | Recife (PE) |
"A proposta de reforma administrativa do atual governo é um acinte ao conjunto da população mais pobre" - Antonio Cruz/Agência Brasil

Quando falamos em reforma pensamos em aperfeiçoamento, melhoria ou ainda conserto, renovação. É esse o intuito que temos em mente quando vamos reformar uma casa ou organizar algo, por exemplo. As reformas administrativas são pensadas com o objetivo de prestar o melhor atendimento dos serviços públicos a população a um custo baixo e ao mesmo tempo com a devida eficiência.

Um Estado moderno, reformado, é a garantia de um serviço público com melhor alcance possível e de maior zelo em termos de utilização do dinheiro dos nossos impostos. Infelizmente não funciona assim no caso brasileiro. A história nos mostra que no nosso caso prevalece no debate público as visões atrasadas das elites econômicas que de forma grosseira ideologizam as divergências de momento e jogam uma cortina de fumaça para apagar o essencial. Foi assim nos modelos de reforma do Estado dos últimos 30 anos. 

O contexto histórico mundial em que foi aprovada a Reforma Administrativa do Estado proposta pelo governo do presidente Fernando Henrique Cardoso e arquitetada pelo ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira teve um componente político e ideológico próprio em momentos de crise econômica e rupturas institucionais. 

No primeiro mandato do Presidente Fernando Henrique Cardoso, foi criado o Ministério da Administração e Reforma do Estado (MARE), comandado pelo ministro Bresser-Pereira, o ministério teve como missão a mudança no cenário da burocracia federal. A reforma do Estado chegou em meio a um debate público ideologizado. 

O debate acerca das medidas do princípio da eficiência, modernização e racionalização da administração pública, teto de gastos para funcionalismo e revogação do regime jurídico único, responsável por uma estrutura rígida e corporativa da carreira pública, elementos da pauta fiscalista, suscitaram oposições acerca do modelo de Estado que estava sendo implementado no Brasil.

A conjuntura marcada pela forte participação política favoreceu a luta contra o desmonte do Estado brasileiro em meio ao contexto de orientação neoliberal do governo FHC, mas a aprovação da Emenda Constitucional por meio de um acordo entre os líderes dos partidos na Câmara dos Deputados ocorreu e em votação apertada passou a proposta do governo. 

O tempo passou e estamos retrocedendo. A PEC 32/2020 proposta de Emenda Constitucional do governo Bolsonaro significa a falência do Estado brasileiro. Propostas contidas na PEC chegam a ser um atraso de século! Criam-se verdadeiras castas nas carreiras de Estado criando exclusivismos, mexe frontalmente na estabilidade, um dos pilares do exercício da independência no serviço público e delega poderes extraordinários ao Presidente da República para redesenhar a administração pública de modo que possa extinguir órgãos e entidades gerando brechas para perseguir politicamente as estruturas indesejadas e ao mesmo tempo satisfazer o apetite privatista do capital econômico.

A proposta de reforma administrativa do atual governo é um acinte ao conjunto da população mais pobre que necessita dos serviços públicos na ponta e uma cegueira administrativa porque visa apenas o suposto “enxugamento da máquina” desconsiderando a inevitável redução da atividade pública essencial. Do ponto de vista político, coloca o Estado brasileiro refém da vontade política de governos de ocasião cujos os efeitos potenciais do processo de desmonte é o enfraquecimento das estruturas do setor produtivo estatal. 

Mais uma vez o debate truncado das elites coloca como ponto central da reforma a culpabilidade do poder público pela denominada crise fiscal do Estado, entoando a conhecida cantilena do Estado mínimo. A estratégia, como sempre, é a difusão através dos veículos da mídia comercial para jogar mais uma cortina de fumaça no conjunto da opinião pública. 

O Brasil do pós-pandemia precisa de mais Estado com capacidade de investimento para rápida retomada do crescimento econômico, o aperfeiçoamento da máquina pública é sempre necessário e será imprescindível no atual período e isso significa o contrário de desmonte. 

A luta para interromper o processo de desestruturação em curso do patrimônio produtivo estatal e social nacional é de todos não se limita apenas aos servidores públicos é um dever cívico é próprio da nossa estrutura constitucional garantir um Estado de Bem Estar social para todos e todas.  

*Eduardo Nunes é professor de História e mestrando em Estado, Governo e Políticas Públicas FLACSO-Brasil/Fundação Perseu Abramo

Edição: Vanessa Gonzaga