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Coluna

Bolsonaristas clamam por constitucionalidade apenas quando lhes interessam

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"É fundamental destacar que a imunidade parlamentar não existe para proteger um indivíduo, mas sim para proteção de todo o parlamento" - Pablo Valadares / Câmara dos Deputados
A imunidade parlamentar não é uma carta em branco


O caso da prisão em flagrante de Daniel Silveira, deputado federal do Rio de Janeiro, apoiador e apoiado por Jair Bolsonaro, chamou a atenção do mundo jurídico. A prisão, na hipótese, seria legal? Houve efetivamente flagrante? Haveria, no caso, afronta à imunidade parlamentar assegurada na Constituição?


Um dos pontos mais curiosos, é o oportunismo dos bolsonaristas, os quais clamam por constitucionalidade apenas quando lhes interessam. De todas as vezes em que as pessoas sensatas do país apontaram para as ilegalidades, inconstitucionalidades e abusos que os Ministros do Supremo Tribunal Federal vinham cometendo ao longo da Operação Lava-Jato, estes mesmos bolsonaristas desdenhavam dos direitos e das garantias constitucionais.


E não só isso. Quando se levanta a bandeira de que a criminalidade não é apaziguada pelo encarceramento em massa dos jovens negros e periféricos nos presídios brasileiros, a frase mais ouvida do lado deles é de que não é possível permissividade com bandidos. É de que bandido bom é bandido morto.


À parte das contradições, incoerências e oportunismos bolsonaristas, é válido discutir a prisão do Deputado destruidor da República de duas formas: a primeira delas é compreender que em 2016, após o golpe de Estado articulado pelo STF, Senado, Câmara, Globo e uma parcela da sociedade civil incapaz de pensar sozinha, houve uma ruptura constitucional. Isto é, o golpe – na época chamado de impeachment, embora até hoje não haja qualquer prova de cometimento de crime por parte da Presidenta Dilma Rousseff – foi responsável por desestabilizar as instituições brasileiras, justamente porque se rasgou a Constituição Federal para forçar a saída da presidência da primeira mulher democraticamente eleita no Brasil e impor uma agenda neoliberal que não passou nas urnas.


Um outro ponto é: a imunidade parlamentar é carta em branco para que os deputados e os senadores possam falar o que bem pensam? Pois bem. Sobre esse ponto é fundamental destacar que a imunidade parlamentar não existe para proteger um indivíduo, mas sim para proteção de todo o parlamento. Ou seja, a imunidade serve para dar segurança aos congressistas de defenderem suas ideias, mesmo que impopulares. No entanto, essa segurança não pode servir de proteção para ideias que atacam o próprio Estado Democrático de Direito.


A Constituição Federal, em seu artigo 53, parágrafo segundo, autoriza a prisão de parlamentares quando estes cometam, em flagrante, crime inafiançável. O delito de ir contra a ordem constitucional e o Estado Democrático de Direito, que fora o crime cometido por Daniel Silveira, é expressamente definido como inafiançável, conforme determina o art. 5, inciso XLIV (quarenta e quatro) da Constituição. De acordo com que é possível se averiguar no vídeo, o Deputado cometeu crime contra a ordem constitucional e o Estado Democrático e, conforme amplamente se envaidece, estimula e participa de grupos armados.


Além disso, é nítida a ocorrência de flagrante na espécie. O Ministro Alexandre de Morais, ao entender pela possibilidade da prisão do Deputado, entendeu que o flagrante ocorreu no caso porque o vídeo estava disponível e, por isso, tratava-se de crime permanente, isto é, crime que é consumado de forma estendida no tempo. Outro fundamento possível também é o curto período que passou entre o momento do vídeo e o momento da prisão, suficiente também para caracterizar o flagrante.


Com todos os problemas do Supremo Tribunal Federal, aos que lutam pelo Estado Democrático de Direito a decisão do Ministro Alexandre de Morais, que depois foi mantida por unanimidade pelos demais Ministros do STF, significa uma luz no fim do túnel. Reconhecer a necessidade de proteger a Constituição, bem como reconhecer que existe um grupo perigoso no poder capaz de tudo para se manter poderoso, é fundamental para se lutar contra o fascismo e conseguir novamente estabilidade das instituições brasileiras. Um passo mais adiante e imprescindível para que o Brasil se mova das trevas e retome ao caminho de aprofundamento democrático é o reconhecimento de que a Lava Jato agiu para e com o interesse de relativizar a Constituição Federal e provocar instabilidade democrática. 

Vejamos, contudo, se haverá coragem por parte dos senhores Ministros para dar esse passo. Ou se essa coragem é similar a dos bolsonaristas: uma coragem oportunista, que só existe quando os ataques à democracia são, também, ataques pessoais a eles.

Edição: Monyse Ravena