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Morrer de fome ou de covid-19? A dura escolha da periferia

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"A população não deveria estar sendo condicionada a escolher entre morrer de fome ou de covid" - Divulgação/MTST
O povo quer voltar a sorrir e não é com esse governo que serão acolhidos

 

O acesso a saúde é um direito fundamental de toda cidadã e cidadão brasileiro. Este acesso, contudo, foi posto em cheque diante da pandemia, fazendo com que os agentes públicos passassem a criar estratégias e políticas públicas que tenham efetividade na vida da população brasileira. Foi, mais uma vez, a possibilidade de vermos a capacidade do Poder público em lidar com uma crise que precisaria de organização, planejamento e responsabilidade, uma vez que a informação só não era - e é - uma arma essencial nesse momento, mas também a promoção de políticas de distanciamento social e assistencial que pudesse manter o povo em suas casas e garantir que o direito mais importante pudesse ser preservado, que é a vida.

Contudo, o que pudemos ver foi a ineficiência, descompromisso e irresponsabilidade em lidar com um momento que exigia não só apreço pela ciência e recomendações técnicas, mas também humanidade. Humanidade esta que tem sido perdida dia após dia. Vidas viraram números e nós, consequentemente, nos perdemos da humanidade. Humanismo esse, inclusive, que tem sido fortalecido dentro das periferias, principalmente porque a solidariedade não é uma virtude, mas uma necessidade diante do convívio em coletivo. É dentro dos morros e das grandes favelas desse país que os atos mais singelos e corajosos nesse período tão sombrio tem nos reconectado a quem nós somos, ou a quem deveríamos ser.

Se antes havia quem dissesse que o vírus era democrático, pois atingia a todas as classes, gêneros e cor, o que sabemos, ou só pudemos reafirmar, é que desde o início do agravamento da pandemia é nos locais mais pobres que os índices de morte em decorrência do vírus tem se alastrado. Afinal, quem, nesse país chamado Brasil, pode ficar em casa? É mais um questionamento de quem movimenta a estrutura desse país, justamente porque é a classe trabalhadora que está exposta a superlotação, falta de saneamento, água, luz, e os acessos mais básicos de qualquer cidadão. O que se pode afirmar é que se o morro realmente estivesse em casa esse país pararia!

Nós entramos no segundo ano da pandemia e o sentimento de angústia e desesperança só tem se intensificado. Falta articulação entre os três Poderes. Faltam líderes que deixem de lado o ego e passe a priorizar a vida. Falta competência e firmeza em lidar com um momento que tem sido normalizado diante de tantas atrocidades e falta de respostas. O Brasil procura respostas em seu momento de maior abandono.

De kit covid-19 à superlotação dos transporte público, os absurdos são inúmeros num país que nunca soube o que é de fato o lockdown. O que existiu ou propõem que exista são pequenas restrições que podem ser viáveis ou não a depender do interesse. O fato é que nos encontramos expostos até hoje, o SUS está completamente colapsado, as UTIs pedem socorro e em meio ao desespero mais vidas se vão. Abril inicia batendo recordes diários e a prospecção é alarmante.

O que quero deixar ciente, caro leitores, é que a população não deveria estar sendo condicionada a escolher entre morrer de fome ou de covid. Em um País em que a democracia e as instituições funcionassem, teríamos um auxílio digno e o respeito a vida como prioridade básica. Aqui, no município de Olinda, existem bairros de extrema vulnerabilidade social, como salgadinho e peixinhos, muitos desses moradores moram em palafitas e se antes já não tinham acesso ao mínimo, agora, até a esperança desapareceu. Diante não só desse mas de tantos outros locais de vulnerabilidade é que precisamos encontrar respostas e sugerir caminhos e é pautando a necessidade de implementar uma renda básica municipal, celeridade na vacinação e trazendo essa responsabilidade para a coletividade que os caminhos mais lúcidos passam a ser discutidos em defesa do povo.

É evidente que todos nós temos o anseio da retomada a normalidade, mas é preciso que se entenda que o momento exige cautela, colocando a vacina como o meio mais efetivo e necessário para a salvação da vida dos que ainda clamam por justiça nesse país.

Foi através da política negacionista adotada pelo Governo Federal no comando de um genocida que estamos dia após dia vendo a tristeza tomar conta do povo brasileiro. O desmonte do SUS, dos direitos e da economia tem afundado, gradativamente, nossa nação, mas é importante afirmar que todos os problemas que a população tem enfrentado nos dias atuais não decorrem, exclusivamente, da incompetência dos que estão atualmente no poder.  A análise é mais profunda e complexa, pois o parecer é social, histórico, econômico e sanitário. É preciso que se diga: o modelo de economia liberal é falido e não nos cabe, sabido, principalmente, que o seu objetivo é a concentração de riqueza.

A desigualdade, fome e desemprego já são uma realidade na vida de milhares de brasileiros e muito desse momento se dá diante da exclusão das massas. Não se pode fomentar um modelo que não impacte positivamente na vida de quem mais precisa. É preciso reajustar o caminho, renovar as esperanças e enfrentar um sistema que tem como intuito potencializar a miserabilidade. O povo tá com fome e é preciso dar de comer. O povo quer emprego e é preciso ter trabalho. O povo quer voltar a sorrir e não é com esse governo que serão acolhidos. Mas para que a luta continue, a fome seja sanada, o emprego volte a ser uma realidade e o choro dê lugar ao sorriso é preciso ter vida.

É valorizando o SUS, as políticas públicas, uma política coletiva e com representantes responsáveis  que o Brasil voltará a ser dos brasileiros(as). Nesse momento em que se é dada a opção de morrer ou morrer não se pode aceitar, tampouco normalizar, que é esse o Brasil que queremos. Não é. Não pode ser. Não será.

As opiniões contidas nesta coluna não refletem necessariamente a opinião do jornal

Edição: Vanessa Gonzaga