Pernambuco

PESCA ARTESANAL

Pernambuco é o terceiro lugar com maior número de conflitos socioambientais, aponta relatório

Publicação do Conselho Pastoral dos Pescadores registra dados de 434 conflitos relacionados à pesca em 14 estados

Brasil de Fato | Recife (PE) |
 A publicação traz ainda um apêndice com dados apurados em 2021, sobre conflitos que foram provocados ou intensificados pela pandemia - Foto: Tania Rego/Agência Brasil

O Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP) lançou a segunda edição do Relatório de Conflitos Socioambientais e Violações de Direitos Humanos em Comunidades Tradicionais Pesqueiras no Brasil. A publicação registra dados de 434 conflitos vivenciados por comunidades tradicionais de pesca em 14 estados. O principal objetivo do documento é dar visibilidade às ameaças que impactam e colocam em risco o modo de vida dos pescadores e pescadoras artesanais. 

Os dados foram levantados em 2018 e 2019 e revelam informações sobre os tipos de conflitos sociais e ambientais que ameaçam o grupo, sobre os agentes causadores e os impactos desses conflitos nas vidas das comunidades pesqueiras. Pernambuco aparece em terceiro lugar na lista que contabiliza os conflitos, seguido de Minas Gerais e Bahia, que lidera o indicador. 

Embora vítimas diretas dos maiores crimes ambientais ocorridos no Brasil, nos últimos seis anos, que vão do rompimento da Barragem de Mariana (MG), em 2015, ao derramamento do Petróleo no litoral do Nordeste e em parte do Sudeste do Brasil, em 2019, os pescadores e pescadoras artesanais e os impactos dessas tragédias nas suas vidas continuam invisibilizados. O relatório aponta que a ocultação desses danos acontece nas recentes tragédias ambientais, mas ocorre principalmente no processo cotidiano que coloca a manutenção do modo de vida dessas comunidades em risco.

O conflito mais registrado na publicação é a  falta de acesso ao território pesqueiro, relatado em 11,75% dos casos. Essa restrição significa o impedimento dos pescadores e pescadoras artesanais de exercerem a profissão, já que praias, rios e lagos são cercados e ficam fechados para a entrada desses profissionais. Além desse tipo de situação, outros 19 conflitos foram descritos na pesquisa, entre eles, desmatamento, especulação imobiliária e pesca predatória, que aparecem respectivamente na segunda, terceira e quarta colocação de casos.

O relatório também revela os principais agentes causadores desses conflitos. As empresas privadas lideram o ranking como responsáveis por 24% dos problemas, seguidas de agentes privados, da área turística, por exemplo, que aparecem em 21% dos casos. Os dados indicam ainda o tempo de duração dos conflitos e apontam as estratégias que têm sido utilizadas pelas comunidades para enfrentarem essas circunstâncias. Em 66% das ocorrências, os conflitos se prolongam por mais de dez anos.

A Secretária-executiva do CPP Nacional, Ormezita Barbosa, vê com otimismo a publicação e divulgação do relatório. “Queremos que essa sistematização de dados se torne um instrumento potente na luta dos pescadores e pescadoras artesanais pela defesa e permanência no seu território. Também visamos que essas denúncias possam subsidiar as inúmeras incidências que os pescadores têm feito nos vários poderes”, comenta.

Para Ormezita, a publicação ajudará a apontar as contradições e lacunas do Estado na relação com o grupo social. Ela acredita que apesar dos agentes privados serem os principais causadores dos conflitos, o governo também tem responsabilidade. “O Estado tem o papel de garantir condições, como marcos regulatórios e instrumentos jurídicos mais consolidados, que reconheçam e garantam a permanência das comunidades pesqueiras nos seus territórios, de forma a reconhecer inclusive o conceito de Território Pesqueiro. Por outro lado, o Estado continua desmantelando as frágeis medidas que de alguma forma podem reforçar essa permanência das comunidades”, critica.

Pandemia

 A publicação traz ainda um apêndice com dados apurados em 2021, sobre conflitos que foram provocados ou intensificados pela pandemia. “Esse levantamento aponta para um agravamento das situações de conflito e a produção de novos problemas, como a impossibilidade de circulação de pessoas e o acesso ao auxílio emergencial e outras garantias” explica o pesquisador Sávio Barros, um dos responsáveis pela organização e redação do relatório.

Para Ormezita, as informações do apêndice contribuem para a confirmação de que nos contextos de crise, há um aumento de empreendimentos que ameaçam as comunidades pesqueiras. “A gente vive essa grande crise humanitária, sanitária e política, e esses contextos são espaços de facilitação de empreendimentos nos territórios de povos e comunidades tradicionais. Conseguimos fazer esse recorte do quanto isso impacta nos territórios de pescadores e pescadoras artesanais. A gente confirma isso no apêndice do relatório e aponta, de forma mais ampla, a relação disso com as medidas governamentais”, conclui.

 

Edição: Vanessa Gonzaga