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Adolescente merece respeito!

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É missão de todas nós cuidar das crianças, fazer com que tenham todos os direitos garantidos, que não vivenciem situações de violência - Marcelo Camargo/Agência Brasil
Proteger adolescentes significa respeitar essa turma

Não é só em ano de eleição que isso acontece. Mas quando se dá a largada para a corrida atrás de votos o fenômeno se intensifica e merece atenção. Pode reparar. Cada vez mais você vai ver políticos (e pretensos candidatos) criando todo tipo de factoide pra poder aparecer para o que entendem ser sua plateia. 

Para certa parcela de uma extrema direita fundamentalista sem conteúdo e com muita sede de poder, a escolha de ‘inimigos’ é uma jogada mais manjada do que andar pra a frente. Essa rapaziada inventa todo tipo de tramóia e falsa polêmica. A ideia é fazer acreditar que ocupa espaços de poder para ‘defender’ as famílias de um improvável ‘ataque’ de forças ‘obscuras’, sempre advindas de uma caricaturada ‘esquerda’ que, no discurso desses protomalafaias, está o tempo todo preocupada em fazer com que a humanidade inteira se torne homossexual e desista de procriar, como se uma coisa ou outra fosse possível.

Se não tem uma treta, digamos, ‘fresquinha’, não tem problema. Se inventa uma. Pode-se querer censurar um filme ruim antigo, espinafrar uma obra de arte qualquer, ou um trecho de algum discurso pode ser pinçado para alegar que as ‘forças do mal’ estão agindo.  A metodologia parece ter sido tirada de um manual. Primeiro grava-se um vídeo (seja numa tribuna legislativa ou no banheiro de casa), preferencialmente aos gritos. Tem muito dedo em pé, muito nome de Deus em vão, muita ameaça e cara de brabeza. Depois posta-se o conteúdo nas redes sociais e se aciona seus asseclas para fazer com que a ‘polêmica’ ganhe corpo. Não raro, na sequência pipocam ações judiciais que geram trabalho desnecessário às instituições e – bingo! – conquista-se algum espaço na mídia comercial, apostando num certo (e abjeto) tipo de ‘jornalismo’ (sic) que aposta na ‘polêmica’ (sic) em busca de curtidas e pontos de audiência no Ibope.

De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente, proteger crianças e adolescentes é prioridade absoluta e tarefa compartilhada por famílias, Estado e sociedade. E é de fato isso que precisamos fazer. É missão de todas nós cuidar das crianças, fazer com que tenham todos os direitos garantidos, que não vivenciem situações de violência nem que sejam expostas a discursos ou conteúdos que possam causar desconforto ou trauma, como imagens de violência ou sexo explícitos ou mesmo propagandas que se utilizam das características de um cérebro em formação para vender produtos ou ideologias contra as quais a pirraiada não tem ainda ferramentas para se defender. 

Já adolescentes, mesmo ainda em desenvolvimento, não são gente boba. Com cada vez mais acesso a ferramentas digitais de comunicação, já faz tempo que não precisam mais esconder revistinha de sacanagem dentro do livro de ciências pra poder ver gente nua. Sobre qualquer assunto, antes de conversar com uma pessoa adulta, pode ter certeza que já deu um google, já foi no twitter, no instagram, nos influencers do youtube e já fofocou com a galera pelo whatsapp. Com cada vez mais serviços de audiovisual por streaming, não tenha dúvida: sua filha só vai obedecer a classificação indicativa se ela mesma achar que faz sentido. 

Proteger adolescentes significa respeitar essa turma. Significa saber que têm desejos, sonhos, opiniões. Que têm acesso a conteúdos que talvez você mesma não tenha. Proteger adolescentes significa ter disposição para conversar e dar respostas difíceis para perguntas complexas. Significa saber ouvir e questionar suas próprias convicções. É caminhar lado a lado e mostrar o caminho das pedras para que se sintam seguras ao experimentar as dores do crescimento, seja no pegar um ônibus pela primeira vez, ficar um pouco mais tarde na rua ou chorar uma desilusão amorosa.

Prender, proibir, esconder, castigar, negar experiências, diálogo ou colo não podem ser consideradas atitudes protetivas. Como pai de uma adolescente, posso dizer que um bom papo mexendo uma panela de vatapá ensina muito mais do que muito carão e ameaça. Cada dia aprendo mais com essa moça linda e me esforço para ser digno de sua confiança. Ao invés de vetar conteúdos, ofereço alternativas. Indico filmes, livros, crio espaços para estarmos juntos e dialogamos abertamente sobre as dores do mundo. Assim a protejo, assim a liberto. E sigo tranquilo caso ela acabe ouvindo os discursos asquerosos que às vezes eu escuto no parlamento onde hoje trabalho. Aos quinze anos de muita sabedoria, minha filha já sabe direitinho que isso é só papo de gente mal intencionada pra enganar as pessoas e ganhar eleição.
 

Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato Pernambuco.

Edição: Rani de Mendonça