A prisão apenas fortalece todo um sistema de dor e subalternização de determinados corpos
No Brasil, a quantidade de mulheres encarceradas têm aumentado drasticamente desde o começo do milênio. Segundo dados do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen), dos anos 2000 até 2017, esse aumento foi de 675%. Somos o quarto país que mais prende mulheres no mundo.
Em disparada, o principal motivo para a prisão dessas mulheres é o tráfico. No entanto, a chamada "guerra às drogas" tem como alvo principal corpos negros, mostrando que o sistema penal é seletivo na hora de julgar e punir.
"O Estado só funciona para determinada população no seu braço punitivo. Ele falta em todo momento em garantir uma dignidade de vida da pessoa e só chega para punir as mesmas pessoas que desde a fundação do nosso Estado estão sendo punidas", afirma Clarissa Trevas, integrante do coletivo Liberta Elas. "Na verdade é uma grande continuidade do nosso sistema escravagista", adiciona.
Dados mostram que o país prende cada vez mais mulheres jovens, negras, sem estudo e mães. Mais de 60% das mulheres presas no Brasil são negras. Em Pernambuco, essa porcentagem é ainda maior: de 81%.
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A prisão é uma questão feminista
Para fazer um trabalho voltado para essas mulheres, foi pensado o coletivo Liberta Elas, um coletivo de feministas abolicionistas e antirracistas que atua na vida de mulheres atravessadas pelo cárcere em Pernambuco.
O Liberta Elas atua desde 2018 na vida de mulheres da Colônia Penal Feminina do Recife, conhecida como Bom Pastor e também na Colônia Prisional Feminina de Abreu e Lima. Já foram feitas ações de entrega de kits de higiene, oficinas de clube do livro, oficinas sobre direitos reprodutivos, violência contra mulher dentro do cárcere e diversos outros temas que contribuem para o empoderamento dessas mulheres.
"A gente não acredita na prisão, o que a gente acredita é no fim das prisões. O sistema de justiça penal é uma ferramenta capitalista e como toda ferramenta do capitalismo, vai explorar e vai submeter determinados corpos, que são os corpos das pessoas negras, das pessoas pobres, das pessoas que estão geralmente à margem", explica Clarissa Trevas sobre a perspectiva abolicionista do coletivo.
Ela ainda reforça que não acreditar nas prisões não significa deixar impune os crimes cometidos. O coletivo acredita na responsabilização dessas pessoas, mas através de outras ferramentas, por entender que a prisão é um instrumento desumano.
Ao serem presas, muitas mulheres são abandonadas pela família e precisam lidar com a solidão. Além disso, com os atravessamentos do gênero em sua vivência, sendo a maternidade uma das grandes questões, seja essa maternidade anterior à prisão ou durante. "O judiciário julga a mulher não só pelo crime que ela está sendo acusada, mas pelo fato dela ser mãe, ele usa a maternidade da mulher, se ele considera uma maternidade adequada ou não… Além de julgar a questão de uma mulher estar envolvida em crime. É um triplo julgamento", finaliza.
Saiba mais sobre o Liberta Elas
O Liberta Elas segue em ações que buscam garantir a dignidade da vida das mulheres encarceradas e das sobreviventes à essa realidade. Quer saber mais sobre o coletivo? Acompanha nas redes sociais @libertaelas.
Para ouvir o programete na íntegra, ouça o áudio anexado no início da matéria. O Vozes Populares é um programete semanal gravado com média de 5 minutos de duração e traz as vozes dos movimentos, coletivos e organizações populares. Confira outras edições em nosso site.
Edição: Rani de Mendonça