LUTA PELA TERRA

Vozes Populares | Povos tradicionais da Bahia usam mapeamento agroecológico em luta pela terra

Ameaçadas pela chegada da Tombador Iron Mineração, comunidades da região de Sento Sé fazem defesa do território

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No dia 4 de junho, um encontro na comunidade Retiro de Baixo, em Sento Sé, reuniu mais de 100 pessoas para debater os resultados do mapeamento - Foto: CPT-BA/Divulgação
Não se faz agroecologia sem sem se falar da terra

É bem conhecida a história de como a construção da Hidrelétrica de Sobradinho retirou à força mais de 70 mil pessoas de suas terras na década de 1970. Após esse episódio, na região de Sento Sé, no norte da Bahia, povos ribeirinhos se reinventaram próximos a uma nova margem, a do Lago de Sobradinho.

São 11 comunidades remanescentes e 2 assentamentos que se intitulam comunidades tradicionais da Borda do Lago. Hoje, todas elas estão ameaçadas pela chegada da Tombador Iron Mineração, mineradora que se instalou no local sem consulta e tem representado uma ameaça ao modo de vida desses povos. 

Como uma ferramenta de luta, foi pensado um mapeamento agroecológico que sistematiza informações importantes e que ajudam na defesa do território. Esse mapeamento específico surgiu de uma demanda da Comissão Pastoral da Terra (CPT-BA) e da comissão Todos Pela Vida, criada pelas comunidades da região. No dia 4 de junho, aconteceu o lançamento oficial do documento e um debate com o resultado das pesquisas. 

Diego Limaverde, integrante do Núcleo de Pesquisas e Estudos Sertão Agroecológico, da Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF), afirma que esse mapeamento teve um caráter emergencial, como uma estratégia aos impactos do avanço mineração na região. "Quando a gente trata de agroecologia, a gente tem que entender que a agroecologia vai além de uma produção sustentável, porque para se fazer produção agrícola tem que se ter o direito à terra", enfatiza. 

A construção de dados sobre a Borda do Lago  


O levantamento teve início no final de 2021 e a partir dos resultados do estudo foram feitos mapas e gráficos / Foto: Arquivo Pessoal

Esse núcleo de pesquisas é um dos integrantes da Rede Territorial de Agroecologia do Sertão do São Francisco Baiano e Pernambucano, que junto a outras instituições (governamentais ou não-governamentais) e movimentos populares, busca promover com as comunidades o desenvolvimento sustentável, a qualidade de vida e a segurança alimentar nos territórios. 

Dentre as ações realizadas pelo núcleo de pesquisa estão atividades de formação, capacitação, sistematização de experiências e promoção da agroecologia junto a agricultores familiares, técnicos, comunidades rurais, peri-urbanas e urbanas no âmbito dos territórios de atuação do núcleo. 

O pesquisador explica de que maneira o mapeamento é utilizado. "Ele é uma ferramenta de luta utilizada pelas comunidades no enfrentamento a esses problemas externos que chegam aos seus territórios. [Para isso], a gente constrói dados que mostram o quão importante são essas comunidades para o ambiente em que elas vivem", explica. 

O mapeamento se preocupa não só em tratar da produtividade agrícola da Borda do Lago para a região, mas também de trazer os modos de vida do território e quais são as ameaças que colocam isso em risco atualmente. 

O protagonismo das comunidades


Mapear informações sobre a região auxilia a comunidade a entender os próprios direitos, reforça o pesquisador / Foto: Arquivo Pessoal

Diego Limaverde ressalta, ainda, que esse é um processo construído pelos próprios moradores. "É um trabalho feito totalmente de forma participativa, é uma pesquisa científica que não é de fora pra dentro, mas sim de dentro pra fora. Não sou eu que estou indo lá, a CPT que está indo lá fazer uma pesquisa. E sim a comunidade faz com que a gente elabore materiais de estudos de acordo com aquela realidade", conta.

É por meio de metodologias participativas que as comunidades produzem os materiais didáticos: através de grupos, reuniões e a apresentação dos dados levantados entre eles. 

Como resultado, o levantamento mostra a importância da produtividade desses territórios para a região, identifica os impactos negativos da mineradora e de outras ameaças externas para o território, traz os aspectos culturais da comunidade e, ainda, trata sobre a preservação da Caatinga.  

Por fim, Diego explica que o mapeamento é também uma forma jurídica de comprovar a existência secular desses povos. "Eles começaram a perceber os direitos deles e também até onde eles podem ir estrategicamente e juridicamente nesse enfrentamento a essa mineração", finaliza. 

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Edição: Elen Carvalho