LUTA FEMINISTA

Vozes Populares | Em PE, SOS Corpo defende o direito ao aborto como uma questão democrática

Segundo integrante da instituição, Silvia Maria, Brasil de Bolsonaro não reconhece direitos reprodutivos

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Instituição informa onde mulheres podem ir para realizar aborto legal e seguro na Região Metropolitana do Recife - Foto: SOS Corpo/Facebook
Um primeiro bloqueio que temos que vencer é a ideologia de que as mulheres existem para serem mães

Dois casos graves no Brasil envolvendo a temática do estupro e do aborto colocaram em evidência o debate sobre os direitos reprodutivos da mulher neste mês de junho. O primeiro deles foi o de uma criança de 11 anos que engravidou após ser violentada. Mesmo amparada pela lei para realizar o aborto, a juíza do caso, Joana Ribeiro Zimmer, induziu a menina a desistir do procedimento. 

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O segundo foi o da atriz que teve sua história compartilhada por um colunista sem sua autorização. Após ser estuprada, ela optou por fazer a entrega voluntária da criança para doação, sem se valer do direito de abortar. Ainda assim, foi condenada pela conduta e constrangida pela exposição de sua imagem e do bebê. Em ambas as situações, os direitos reprodutivos da menina e da mulher foram desrespeitados. Mas você sabe o que são esses direitos? 

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O que são direitos reprodutivos?

Quem explica é Silvia Maria Camurça, educadora do SOS Corpo Instituto Feminista para a Democracia, militante feminista do Fórum de Mulheres de Pernambuco e integrante da Frente Pernambuco Contra a Criminalização das Mulheres e Pela Legalização do Aborto. "Os direitos reprodutivos englobam o direito de ter filhos, o de não ter filhos, o de interromper a gestação quando é impossível a gente sustentar uma nova vida, e o direito de criar os filhos", elucida. 

Assim, tratar sobre direitos reprodutivos é falar sobre autonomia reprodutiva e garantir que todas as mulheres tenham acesso a informações e métodos conceptivos e contraceptivos, de maneira gratuita. Além de terem também o direito a contracepção de emergência e ao aborto legal. Tudo isso pode e deve ser assegurado através de políticas públicas. 

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Como fruto das reinvindicações do movimento feminista, os direitos reprodutivos foram reconhecidos ao redor do mundo e hoje estão em legislações internacionais. Segundo a educadora, o Brasil foi um dos países que também os reconheceu. No entanto, o governo Bolsonaro representa um retrocesso na questão. "Nesse governo, os direitos reprodutivos estão ameaçados, ele [Bolsonaro] cancelou o Programa de Saúde da Mulher, por exemplo, que cuidava da mulher em todas as fases da vida para dar o foco à mulher gestante. A gente voltou a ser apenas uma máquina, uma incubadora", critica.

Ela ainda reprova o discurso de defesa a vida proferido pelos que querem controlar o corpo feminino. Para a feminista, a defesa só ocorre quando a vida está na barriga da mulher. "Depois que a criança nasce, eles não garantem escola, não garantem moradia pra mãe, não garantem emprego pra família... É uma mentira essa defesa da vida". 

Conheça a SOS Corpo

Em Pernambuco, o Instituto SOS Corpo atua há 40 anos na defesa do corpo da mulher e na luta por melhores condições de vida para este público. O trabalho da organização tem sido o de fazer educação popular de base com as companheiras espalhadas pelo estado: nos bairros, sindicatos rurais e urbanos, no contexto da agroecologia, onde quer que seja a necessidade. A instituição faz um trabalho de formação e conscientização para o fortalecimento dessas mulheres. 

Uma das frentes de ação é com foco na comunicação com material educativo sobre os diversos direitos das mulheres. Entre eles, estão os direitos reprodutivos.

Para caminhar para uma sociedade que respeita a autonomia reprodutiva da mulher, a educadora reforça que o primeiro passo é combater a ideologia de que toda mulher quer ser mãe. Ela defende: é necessário reconhecer as mulheres como seres humanos que possuem seus projetos de vida e que não existem apenas para reproduzir. A maternidade deve ser uma escolha e não uma imposição. 

Onde realizar aborto seguro e legal em Pernambuco?

No Brasil, através do artigo 128 do Decreto Lei nº 2.848 de 07 de Dezembro de 1940, o aborto é considerado legal quando a gestação é fruto de uma violência sexual ou quando representa um risco para a saúde da mulher. Além disso, a partir de um julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF), em 2012, é permitido interromper a gestação quando o feto não possui cérebro (feto anencéfalo).

Portanto, teoricamente, qualquer hospital ou maternidade deveria oferecer o serviço livremente para todas as mulheres. No entanto, Silvia Maria explica que o fato de não ser legalizado implica na não obrigatoriedade em realizá-lo. "Depende do diretor do hospital e de cada medico. Por isso, alguns serviços se organizaram para fazer esse atendimento", explica. 

Na Região Metropolitana do Recife, ela cita três locais que fornecem o atendimento. O Hospital da Mulher, através do serviço do Centro de Atenção à Mulher Vítima de Violência – Sony Santos, o Centro Integrado de Saúde Amaury de Medeiros (CISAM) e o Instituto de Medicina Integral Prof. Fernando Figueira (IMIP).

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A educadora afirma que no Hospital da Mulher, por exemplo, a mulher recebe o apoio de toda uma equipe, inclusive assistência social e psicológica. "Você pode ter atendimento psicológico de até dois anos se precisar. Além de fazer o aborto se precisar, pode receber toda a medicação de profilaxia contra Aids, Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST) e contra gravidez se não houver engravidado".

Para conhecer mais o trabalho da SOS Corpo, você pode acompanhar o Instagram @soscorpo.feminista. Além disso, a instituição oferece acolhimento para mulheres que precisam tirar dúvidas sobre serviços assistenciais no estado de Pernambuco. Você pode entrar em contato através do telefone (81) 3445-6847 ou ir na sede da organização no Recife, que fica na Real da Torre, número 593, bairro Madalena

Edição: Elen Carvalho