Pernambuco

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“O setor privado entra para disputar vacinas com o governo brasileiro”, avalia médico

Médico e professor Aristóteles Cardona considera que o PL 948/2021 atrapalha plano nacional de vacinação

Brasil de Fato | Recife (PE) |
Deputados aprovaram projeto de lei que permite iniciativa privada disputar com o SUS pela compra de vacinas; 13 pernambucanos foram favoráveis - Aluísio Moreira/Governo de Pernambuco

Nesta terça (6) e quarta-feira (7) a Câmara Federal aprovou, em primeiro e segundo turno, o Projeto de Lei 948/2021, que autoriza empresas privadas a adquirirem vacinas contra a covid-19. A proposta acabou apelidada de “camarote da vacina”, por permitir acesso facilitado a vacinas a quem puder pagar por ela. A maior parte dos deputados federais pernambucanos votou a favor do projeto. 

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No quadro atual as fabricantes de vacinas não estão conseguindo atender as demandas do mundo. E o governo brasileiro tem retardado a aquisição tanto de vacinas prontas quanto de insumos – para que instituições nacionais, como o Instituto Butantan, possam produzir vacinas em parceria com fabricantes internacionais.

Em entrevista ao Brasil de Fato Pernambuco, o médico de família e comunidade e membro da Rede Nacional de Médicos e Médicas Populares Aristóteles Cardona, considera que, com este cenário de poucas vacinas disponíveis, o PL é a legalização do “fura-fila”. “Essa lei vem no sentido de flexibilizar, dar um ‘jeitinho’ para empresas privadas tenham acesso a vacinas antes mesmo que o Brasil consiga avançar minimamente no programa de vacinação nacional, que é todo baseado em grupos prioritários, critérios clínicos e técnicos”, lamenta o profissional. “Essa lei acaba por permitir que empresas possam ‘furar’ essa fila de prioridades no Brasil”, diz o médico.

Na avaliação de Aristóteles Cardona, a compra de vacinas pela iniciativa privada não vai acelerar a vacinação e nem ampliar as opções, porque num cenário em que há menos vacinas que a demanda, as empresas não se somarão ao Estado, mas acabarão competindo contra o SUS. “O argumento utilizado por quem defende esse ‘fura-fila’ é de que vai ampliar o acesso à vacina ou que vai trazer mais vacinas para o país. Mas isso não existe, porque não tem vacina sobrando no mercado. O que há é uma fila de países na espera por essas vacinas. Então o setor privado não será ‘um canal a mais’ buscando, mas entra para disputar com o governo brasileiro”, avalia ele, que também é professor na Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf).

O argumento de que a aquisição privada ajudaria a economizar recursos públicos também é descartada por Aristóteles. “O quantitativo que será adquirido por esses empresários não é tão grande. Em termos de dinheiro público é um valor irrisório. O governo brasileiro tem dinheiro para comprar as vacinas, o que tem faltado é interesse. E não são empresas privadas que resolverão isso”, avalia o professor.

Para Cardona, as dificuldades encontradas hoje na aquisição de vacinas pelo Brasil são consequência da postura desinteressada do governo brasileiro em adquirir os imunizantes. “O Governo Federal tem tratado essa aquisição de vacinas de modo muito negligente desde o início. Ignorou contatos de produtoras de vacinas oferecendo dezenas de milhões de doses, retardou a assinatura de contratos de compra e agora estamos com dificuldades”, pontua.

Alguns empresários vieram a público, nas últimas semanas, afirmar que seu interesse na aquisição das vacinas é imunizar os funcionários de suas empresas. Cardona reafirma que isso é um modo de “furar-fila” adquirindo vacinas que seriam para grupos prioritários e destaca o que ele chama de “armadilha”. “Esse PL permite que sejam compradas vacinas ainda não aprovadas pela Anvisa. Quem vai garantir a qualidade dessas vacinas que serão compradas? E se um empresário comprar vacinas de qualidade duvidosa e quiser aplicar em seus funcionários?”, questiona.

Como votaram os pernambucanos

Nas votações a base governista foi majoritariamente favorável ao PL 948/2021, que foi aprovado com 317 votos favoráveis, 120 contrários e 2 abstenções. Aprovado em dois turnos na Câmara, o PL segue para o Senado e, ao que tudo indica, deve ser aprovado e seguir para sanção do presidente da República. Entre os 25 deputados federais pernambucanos, 13 foram favoráveis a aquisição de vacina pela iniciativa privada, com 10 contrários, 1 abstenção e 1 ausência.

Foram favoráveis ao “camarote da vacina” os deputados Felipe Carreras (PSB), Daniel Coelho (CD), Augusto Coutinho (SD), Fernando Monteiro (PP), Fernando Rodolfo (PL), Silvio Costa Filho (REP), Ossésio Silva (REP), Ricardo Teobaldo (PODE), Sebastião Oliveira (AVA), Fernando Coelho (DEM), Pastor Eurico (PATRI), André Ferreira (PSC) e Luciano Bivar (PSL).

Ficaram contra a proposta os deputados Carlos Veras (PT), Danilo Cabral (PSB), Milton Coelho (PSB), Gonzaga Patriota (PSB), Tadeu Alencar (PSB), Renildo Calheiros (PCdoB), Túlio Gadêlha (PDT), Wolney Queiroz (PDT), Raul Henry (MDB) e Eduardo da Fonte (PP).

O deputado André de Paula (PSD) esteve ausente da votação, enquanto Marília Arraes (PT) optou pela abstenção e acabou envolvida em polêmica. Ao se abster, ficou em contradição com seu partido, que indicou o voto contrário. Para justificar a abstenção, divulgou vídeo reafirmando a defesa do SUS, mas dando opiniões mostrando concordância com o PL 948/2021. O vídeo teve repercussão negativa e ela deletou a peça das redes, publicando em seguida um pedido de desculpas e afirmando que sua posição foi um erro.

No Senado Federal há três representantes de Pernambuco: Humberto Costa (PT), Jarbas Vasconcelos (MDB) e Fernando Bezerra Coelho (MDB), sendo este último o líder do governo Bolsonaro na casa.

Edição: Vanessa Gonzaga